Edmilson Peixoto
Produzido por Edmilson Alves Peixoto
Publicado na Edição nº 17 do Jornal "O Pioneiro"

É cada vez mais impressionante a incapacidade de aprender a aprender por parte dos estudantes dos sistemas públicos de ensino, numa geração onde impera o famoso “faz de conta que ensina que eu finjo que aprendo”.
O poder da reflexão que está no interior de cada indivíduo para a construção crítica do saber, já não prevalece mais, e passou a dar espaço para a ignorância, sendo comum ouvirmos elogios ao repugnante e indignação pelo eloquente do tipo: “passa uma prova facinha”, “a prova tava de matar”; “quem não cola, não sai da escola”; “estudar prá que se o futuro é a morte”; e por aí vai.
As aulas, com menos de uma hora cada, não são momentos de aproveitamento para a busca de conhecimento, parecem mais momentos de tortura e que duram uma eternidade.
Quanto aos professores, estes recebem denominações especiais de acordo com sua metodologia. Os bonzinhos são aqueles que geralmente fabricam notas por falta de conteúdo e quando aparecem, ocupam o “tempo eterno” como a maioria quer, ou seja, também não estão muito a fim de produzir nada. Os marrons são aqueles que estão entre a cruz e a espada. Vez por outra comporta como mocinho, outras vezes como bandido. Já os chatos, que também são conhecidos por alguns de “caxias”, são repugnantes por exigir um pouquinho mais de esforço do aluno. Sempre está presente em todas as aulas e utiliza como método de avaliação algumas atividades reflexivas.
Podemos considerar que estamos vivendo a super modernidade do século XXI, na era da microeletrônica e quando se reportam sobre culturas anteriores denominam-nas de “atrasadas”, como aquelas do período socrático. Há uma contradição porque naquele período havia o interesse em adquirir o conhecimento, ao passo que no nosso tempo, busca-se adquirir apenas o diploma. Então o “atraso” está é aqui. Assim, recorro a Balsa Melo, poeta paraibano que disse: “compadeço-me com o analfabetismo em face da falta de oportunidades. Mas não consigo conviver com os diplomados-analfabetos!”
A ignorância é tanta que quando alguma disciplina não é ofertada por falta de professor, não vê nenhum problema porque não interessa o aprendizado, mas sim as notas e estas serão lançadas no boletim. E acham que melhor seria se fossem distribuídas notas para todas as disciplinas e que nem precisasse de professores. Ou seja, basta apenas uma nota mínima e que satisfaça o sistema pra que já estejam prontos os analfabetos diplomados sem preparo para o futuro, mas preparados para o fracasso.
Portanto, este é o sistema de ensino que temos e que prega a qualidade, mas que dá condições apenas para a formação de um grande contingente de analfabetos escolarizados.
Edmilson Peixoto
Escrito por Edmilson Alves Peixoto
Sou torcedor do Vasco da Gama, mas confesso que o Adriano e Vagner Love, atacantes do time do Flamengo, deram lições de sociologia para muita gente, quando repercutiram na mídia, não somente pelo bom futebol que praticam, mas por retornar às origens, na favela. Adriano confessou uma briga de casal e explicou sobre um “presente” que havia dado, mas depois caiu nas graças dos torcedores. Vagner Love admitiu no mesmo período ter estado numa festa na favela e que havia traficantes armados por lá. Todo mundo sabe que muitas favelas são governadas por traficantes. E todo mundo sabe que qualquer coisa que aconteça nesses lugares conta com a presença dos soldados do tráfico. Então, se há uma festa por lá, todo mundo sabe o que está acontecendo. Mas ninguém pode ver isso na mídia. Quando o Love foi para a festa e um vídeo foi divulgado com ele andando cercado de homens armados, foi aquele barulho. Basicamente, é o contrário do que aconteceu com o Adriano, mas essas coisas ninguém deveria ver. É uma vergonha quando as evidências da ausência do Estado se materializam.

A resposta de Love foi incrivelmente sincera: eu sou da favela, vivi lá, frequento aquele lugar. E isso quer dizer: sempre convivi com os soldados do tráfico, como qualquer morador de favela. Observem que ninguém sai na mídia porque foi em festa que tinha traficante armado na favela, a não ser que seja o Vagner Love. Aí não pode. Será investigado pela polícia. Cometeu um crime horrível. Deu visibilidade à incapacidade do Estado. Tornou visível o que deveria ser invisível.

Enquanto dois homens públicos e de origem humilde expunham sinceramente suas vidas, com efeitos opostos, o Estado expunha também uma terrível dialética visível/invisível: retirava de uma mãe cigana sua filha de um ano, à força, em frente às câmeras na cidade de Jundiaí/SP. O juiz da Vara da Infância e da Juventude determinou que a criança fosse retirada da mãe, pois esta estaria utilizando-a para conseguir esmolas (estaria “visibilizando” a criança, que não poderia ser assim explorada). A decisão foi tomada por conta de uma denúncia anônima, mas muitos confirmaram que ela estava apenas lendo mãos (não pedia esmola) e levava sua filha no colo.

Foi um ato de preconceito. A sorte da mãe cigana foi ter sido filmada perdendo a filha, imagem que sensibilizou muita gente. Depois da repercussão, o mesmo juiz determinou a devolução da criança.

O fato é que se as câmeras não tivessem filmado a separação, a mãe cigana ainda estaria chorando pela filha. Imaginem quantos não sofrem por infringir leis não escritas de visibilidade/invisibilidade? O ataque do flamengo, de alguma forma, produziu um curto-circuito nessas regras, fazendo nos ver o que não deveríamos ver, ou melhor, nos fez ver melhor o que aconteceu com a mãe cigana e refletir sobre tantas cenas que ocorrem na invisibilidade e nos perguntar: os ciganos tem que se submeter a padrões comportamentais que não são deles? Pode-se arrancar da mãe, com força policial, sua filha bebê, porque ela é cigana? É crime ser cigano neste país?